Brasil está hoje menos exposto comercialmente à Venezuela
Embora a nova crise política na Venezuela – com uma eleição presidencial cujo resultado tem sido contestado interna e externamente por falta de transparência – seja uma preocupação mais forte dos países com os quais o país faz fronteira ou tem relações comerciais mais frequentes, o Brasil é uma das nações da América Latina com o menor grau de exposição comercial ao parceiro.
Entre os motivos para isso estão a perda de relevância econômica da Venezuela nas últimas décadas, o afastamento político e diplomático com o Brasil iniciado na gestão de Michel Temer e continuado sob o governo Bolsonaro e o menor fluxo migratório rumo ao Brasil nos últimos anos – isso em comparação com os vizinhos.
Segundo um relatório do Bradesco BBI, o impacto para o Brasil chega a 0,7% da balança comercial, o que significa uma exposição de apenas 0,03% como proporção do PIB. Pelo estudo, a balança comercial da Colômbia, do Peru e até da Argentina podem sofrer mais os efeitos de uma crise continuada.
“A Colômbia é o país com maior exposição comercial à Venezuela. As relações comerciais entre a Venezuela e outros países da região não têm sido materiais nos últimos anos, devido ao declínio contínuo da economia venezuelana”, diz o relatório do banco.
O banco destaca que alimentos e produtos agrícolas são os itens mais demandados pela Venezuela, com maior potencial de impacto nas importações vindas Peru. Por outro lado, petróleo e produtos petroquímicos são os mais vendidos pela Venezuela, especialmente para Colômbia, México e Argentina.
Perda de relevância
Mass nem sempre foi essa a realidade. Durante os dois primeiros mandatos de Lula (2003-2006 e 2007-2010) e o período da presidência de Dilma Rousseff (2011-2016), a Venezuela foi grande protagonista na balança comercial brasileira, com alguns impactos duradouros.
Entre 2003 e 2022, segundo dados da Secex, o Brasil exportou US$ 52,9 bilhões em produtos e serviços para a Venezuela e importou US$ 10,5 bilhões, conquistando um saldo positivo de US$ 42,4 bilhões.
Claro que o período no qual a corrente de comércio foi mais intensa foi entre 2003 e 2016. O pico das exportações brasileiras para o país foi de US$ 5,13 bilhões em 2008, quando a Venezuela ainda era governada por Hugo Chávez, um grande aliado de Lula.
Mas a corrente de comércio, que chegou a US$ 6 bilhões em 2013, caiu para apenas US$ 1,7 bilhão em 2022.
Um estudo recente do Ipea afirma que as expressivas alterações no comércio bilateral entre os dois países podem ser explicadas pelas mudanças políticas. Sob o governo Lula e com Chávez centralizando as decisões, o Brasil beneficiou-se amplamente da fragilidade institucional do regime venezuelano.
Contudo, segundo o estudo, a baixa institucionalização dos mecanismos de interação possibilitou uma abrupta queda a partir da desaceleração observada já em 2015. “Com a mudança de governo no Brasil, em 2016, houve também alterações de entendimentos bilaterais com a Venezuela, afetando diretamente os resultados comerciais”, afirma o relatório.
A primeira dessas alterações foi a redução dos contatos bilaterais político-diplomáticos com o país. A segunda, derivada da anterior, foi a redução da complacência brasileira com relação às dívidas da Venezuela com o Brasil, em especial por parte de autarquias, como o Banco Central (BCB) e o BNDES.
Em 2017, por exemplo, o BC suspendeu os registros de operações com a Venezuela no âmbito do Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos (CCR), da Aladi, por conta de recorrentes atrasos no cumprimento do pagamento da dívida da Venezuela com o Brasil.